Errante Sangria

Batidas compassadas cada vez mais exíguas

Os fluídos vitais ardem ao passar por minhas veias
Quero me livrar desses aparelhos
Ter meus sangue absorvido por aquela areia
Ter minhas debilitadas mão embebidas
Nesse mesmo impuro líquido escarlate
Deixar explodir essa bomba-relógio
Que no meu peito sofregante ainda bate
Fazendo com que cada segundo pareça o último
Fazendo-me ter a pressa de explodir
Só com tais escombros internos
Poderia cogitar voltar a sorrir
Mas a vida me volta com essas agulhas
Com essa depressão intravenosa
Cada respiro inodoro
Alma cada vez mais leprosa
E o culpado disso tudo
Continua a tamborilar
Esse coração imundo
Ainda tem a audácia de fazer meu sangue bombear
Eu eu continue a sentir
Esse tenebroso amor
Qual tentei de toda forma esvair
Qual apenas me fez decair em dor
Por tantas vezes me impediu de sorrir
Mesmo nas mais belas noites
De apreciar o luar
O quão belo seu brilho fosse
Tal brilho em minhas cansadas retinas
Apenas uma luz fraca e desfocada
Culpa desse tal orgão vital
Não conseguir mais apreciar essa beleza prateada
para que existir então
Se não consigo viver?
Já que existo, mas não vivo mais
Acabar com tudo é o melhor a se fazer
Foi o que tentei
Ao usar aquela fina areia como leito
O que mais tive gana de acabar
Ao rasgar, com um fino e reluzente punhal, meu peito
E pensar nesse seus olhos
Enquanto o mar se alimentava de mim
Ter teus sorriso por minhas lembranças
E pensar que um dia fostes assim
Do modo com ainda habitas
Minha mente, meus sonhos
Com seu olhar outrora tão compenetrante
E suaves contornos risonhos
Os minutos que sangrei no litoral
Foram os últimos que possuí um sorriso nos lábios
Foi o único momento em minha trôpega vivência
Que senti tomada a atitude de um sábio
cada gota vermelha que respingava
E a areia diluia
Com intensidade única, renovava
O meu ápice de alegria
Minha visão, já ofuscada pelas acumuladas lágrimas
Lágrimas essas, matavam a sede do sono arenoso
E eu tinha o momento mais bem-vivido
Desse existir até então insosso
E eu o deleitava
Estava leve, livre
Quão mais perto da morte ficava
Mais forte estive
Até o momento que minhas pálpebras se juntaram
E tudo virou apenas escuridão
Esse enxergar das trevas
Foi, em vida, minha melhor visão
Ao esvair esse sangue, esvaiu-se a consciência
E assim foi meu momento de nirvana
O meu objetivo era tentar esquecer-te
E me livrar dessa coisa mundana
Mas para meu assombro e desespero
Nessa cama branca de hospital, meus olhos voltaram a funcionar
Meu maior medo tomou vida
Voltei a te amar.








Luzes Acesas


                   O pai de Caio chegara em casa com todo o seu cansaço habitual de homem trabalhador, que suava para conseguir sustentar sua família com horas de trabalho duro. Já era tarde da noite, e, após ter tomado banho, adentrara no quarto, qual sua esposa o esperava com as luzes acesas, coisa que não acontecia naquela casa, ele se sentou na ponta da cama e a conversa começara.
               Nesses mesmos instantes, Caio levantara de sua cama para tomar um copo d’água, mas ao ver a porta entreaberta no quarto dos pais, passou com lentidão prestando atenção em sobre o quê falavam eles.
               - Acho que devemos contar logo a ele - Ele ouvia suma mãe dizer - ele tem o direito de saber a verdade.
               - Não! - Seu pai dissera com firmeza - ele ainda não está pronto para saber disso.
               - Mas ele merece saber a verdade sobre a vida dele.
               - Ninguém vai contar nada para o Caio - Disse, dessa vez mais nervoso, o pai do garoto. - e esse assunto acaba por aqui, entendeu?!
               - Claro.
               A porta se fechara e a luz foi apagada.
               Caio estava ali, perplexo, voltara ao seu quarto, e, deitado em sua cama, ficara lembrando da conversa que seus pais haviam tido naquela noite. Ele pensava, imaginava e criava hipóteses sobre o quê poderia ser. Algo que ele, no auge de seus quatorze anos, ainda era imaturo para saber, algo sobre sua vida. Seria também algo que mudaria o rumo dela também?
               Nos dias que se seguiram, o garoto andara quieto e agia com considerável desanimo, aquela conversa que ouvira martelava sua cabeça com uma explosão de hipóteses sobre o que se tratava tal assunto. Ele queria saber. Ele tinha o direito de saber, já que era algo tão importante e que envolvia-no. Que mexia com seu passado.
               Um dia sua mãe percebeu que o menino andava estranho, demasiadamente quieto, totalmente diferente daquele garoto extrovertido, sorridente e tagarela que Caio sempre fora. Sua mãe foi falar com ele para tenta descobrir o que acontecia com o menino.
               - Caio, porquê está tão quieto nesses últimos dias, aconteceu alguma coisa?
               Caio deveria ou não dizer sobre aquela noite? Ele decidiu que sim, respirou fundo e começou:
               - Mãe, é que eu ouvi...- Nesse momento a porta se abrira e seu pai adentrara ao cômodo , deixando Caio paralisado. Ele instantaneamente se calou e seus olhos ficaram assustado.
               - Oi amor - Disse ele para a esposa, dando-lhe um beijo - Olá garoto.
               - Porquê chegou tão cedo hoje? - Indagou a mulher.
               -Cansei de me sacrificar fazendo horas extras, agora quero ficar com a minha família o maior tempo possível.
               - Mas, e as despesas?
               - Damos um jeito.
               - Ele foi em direção ao quarto pegar roupas e em seguida foi a banheiro tomar um banho.
               A mãe se voltara novamente à Caio:
               - O quê estava me dizendo mesmo?
               - Nada não mãe. Vou dormir, boa noite.
               - Boa noite, filho.
Naquela noite , mais uma vez estava o quarto de luzes acesas, o homem adentrara-no e logo a mulher o disse:
               - Não é para ficar com a família que você está fazendo isso - dizia ela em tom acusador - é para vigiar á mim e ao Caio.
               - Isso mesmo! Você acha que não te conheço? A primeira oportunidade que aparecer você falará tudo.
               - Não confias em mim?
               - Nesse caso? Não! Agora apague essa maldita luz que eu preciso dormir.
               Dessa vez Caio não ouvira nada, já estava dormindo, mas, de certo modo, também sabia que o motivo que seu pai dera era falso.
               Caio agora queria falar sobre o assunto, saber a verdade, mas apenas confiava em sua mãe para isso, e por conta do novo horário de trabalho seu pai e sua escola, nunca mais ficara a sós com ela para falar sobre tal assunto.
               Os dias se passavam, e aquela rotina sempre impedia Caio de procurar adentrar sobre tal assunto.
               Uma semana depois, ao deitar, ouviu barulhos de papéis em seu travesseiro, ele repetiu a ação para confirmar o que acontecera. Ele se levantou, acendeu a luz e foi olhar o que fizera aquele barulho, ao colocar a mão dentro do travesseiro, ele sentiu os papéis em sua mão, ele os puxou com as pontas dos dedos, os pegou, os arrumou e viu. O primeiro era uma foto de dois adultos até então desconhecidos segurando um bebê, ele fitou a foto pensando no que aquilo significaria, resolveu ver o outro papel, era um recorte de jornal, ele leu e seu queixo caiu, seu coação disparou, não acreditara naquilo que vinha em sua cabeça, após ler e reler aquele recorte, qual relatava um acidente de carro no qual, os citados Maria e Sérgio morreram na hora e o filho do casal e o filho do casal sobrevivera, filho esse que se chamava Caio, que, segundo a reportagem, passaria a viver com os primos de seus verdadeiros pais, depois do recorte havia uma segunda foto, sua verdadeira mãe, junto aquela qual acreditara ser sua genitora.
               Agora as coisas faziam sentido em sua cabeça, a única coisa que não entendia, era o motivo de terem escondido isso dele, porque não lhe contaram logo a verdade?
               No dia seguinte, Caio pegou uma sacola, colocou algumas roupa e os papéis encontrados no travesseiro, e, quando teve uma brecha, fugiu de casa.           
               Uma semana depois fora encontrado morto com um tiro nas costas e os recortes e fotos nas suas mãos.
               Após esse acontecimento, aquele homem descobrira o que sua mulher havia feito e a espancara, quase lhe tirando a vida e logo após fugira para uma outra cidade, uma pequena do interior qual passara a sua infância.
               Hoje, anos depois desses acontecimentos, Caio continua sozinho, ninguém sabe por onde anda aquela mulher que lhe contara à verdade, ela nunca mais visitara o túmulo do garoto, que agora é apenas mais um no meio de tantos.